Publicação “Prostituição: uma abordagem Feminista” pela SOF

“Resultado do esforço da SOF que, em sua atuação, tem buscado construir um feminismo que apresente uma visão integral sobre a opressão das mulheres, a publicação “Prostituição: uma abordagem feminista” pretende trazer elementos que contribuam para a compreensão da prostituição em seu papel estruturante no patriarcado. Recuperando o debate feminista sobre a sexualidade, a publicação aborda a maneira como a prostituição se consolidou em nossa sociedade, o que ela representa e a quem serve, interligando o tema da prostituição com o debate sobre raça e classe.”

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fonte: http://www.sof.org.br/artigos/prostitui%C3%A7%C3%A3o-uma-abordagem-feminista

Papel dos meios de comunicação na criação de cultura de prostituição e na produção do discurso do proxenetismo

Todo ano, há lançamentos de filmes, livros (geralmente logo convertidos em best-sellers momentâneos), séries, novelas, que retratam mulheres na prostituição. Qual a função e o papel que desempenham os meios de comunicação no momento de justificar essa violação de direitos humanos, naturalizar prostituição e reforçar mitos sobre a mesma?

A mídia e o cinema, as novelas são as principais aliadas no momento de construir o discurso do proxenetismo – aquele que diz que a prostituição é uma escolha, empoderante, voluntária e glamourosa. A mídia, o cinema, os romances, produzem um discurso sobre a prostituição que beneficia e protege, autoriza o privilégio masculino de acesso aos corpos das mulheres, e que individualiza e até mesmo coloca a prostituição como uma transgressão moral por parte das mulheres. Essa visão distorce a realidade da prostituição constrói e reforça os mitos da prostituição e servem como veículo para favorecer o discurso cultural que naturaliza e torna aceitável o proxenetismo. É o discurso que vem sendo reproduzido na sociedade e que contribui para legitimar a prostituição. É preciso desfazer esse discurso e mostrar como ele está ancorado no Patriarcado.

Por exemplo, na reportagem sobre este filme recente, premiado em Cannes pelo que consta, diz:

“Garota de 17 anos que mergulha na prostituição sem motivo aparente”
Ou seja, a culpabilização da vítima, reincidente nos filmes.
Erotizando a prostituição de pessoas, a apresenta como voluntária e culpa da pessoa que é consumida, construindo a imagem misógina da prostituição, erotizando abuso infantil, apoiando este, glamourizando e apresentando como rebeldia pessoal como forma de respaldar a prática de clientes e desresponsabilizar homens, ajudando a instaurar a cultura de consumir pessoas.
A cultura de prostituição demanda pessoas traficadas, pessoas que caiam nas redes de prostituição. Embora atravesse todas classes e idades, não serão ‘jovens e ricas’, serão principalmente negras e pobres, de 3o mundo. Não se cai na prostituição por acaso. Há uma rede de facilitadores, há um processo de recrutamento, a prostituição livre é uma ilusão que beneficia proxenetas. Todo o terreno da prostituição e da indústria sexual geral é organizado e corporizado pelos homens que dela a lucram.

Recuse a ‘arte’ enquanto forma de construir discursos que contribuam para a injustiça social. Demandemos a produção de uma arte que esteja alicerçada em éticas de construir um mundo igualitário e que produzam referências positivas para a criação de uma sexualidade da igualdade.

Mitos sobre a prostituição

As feministas exigem: nenhuma mulher mais vítima das redes de prostituição

As feministas exigem: nenhuma mulher mais vítima das redes de prostituição


baixe o pdf: MITOS SOBRE A PROSTITUIÇÃO.

Ao redor da prostituição, um conjunto de mitos falseiam sua realidade e dificultam uma aproximação racional à mesma.

É a profissão mais antiga do mundo

Falso . Pressupôe que a prostituição é um atributo inato das mulheres e, portanto, inevitável, construção muito conveniente ao patriarcado e aos exploradores.

A prostituição coloca o próprio corpo a serviço de outra pessoa, para que seja usado como mercadoria. Portanto não é profissão senão que escravidão. É impossível vender o corpo sem danar a alma. Em sociedades primitivas, as mulheres apareciam como parteiras, alfareras (pesquisar), artesãs, curandeiras, mestras, condutoras de carro, colectoras, antes que praticando a prostituição. Estes trabalhos exercidos pelas mulheres se podem comprovar pela arqueologia e pela mitologia popular, mas são ignorados pela “historia” patriarcal. A prostituição tem um início preciso: a afirmação do patriarcado.

É uma forma fácil de ganhar muito dinheiro

Falso. As mulheres em situação de prostituição sofrem danos irreparáveis, comparáveis com os danos de uma pessoa que foi torturada, que esteve numa guerra. A grande maioria das mulheres em situação de prostituição é muito pobre. Os proxenetas são os que se enriquecem. O tráfico internacional e interno de mulheres para as redes de prostituição é um dos negócios mais rentáveis, junto com o tráfico de drogas e armas.

Estão nessa porque gostam

Falso . A maioria chega à prostituição após histórias de violência, vulnerabilidade, enganos (de seus companheiros, familiares), estupros, exclusão e falta de educação. Muitas também são sequestradas e obrigadas, mediante torturas, ameaças, violências. A prostituição não é escolha. É uma opção quando não resta outra opção.

É uma escolha livre, a assumem de maneira voluntária

Falso . Para milhões de mulheres, escolher entre fome, abuso, isolamento ou prostituição não representa uma verdadeira opção. Quando uma sociedade aumenta os espaços de igualdade, social e sexual, e de nivel de vida, disminui o número de mulheres do próprio país que se dedicam à prostituição. Se necessitam muitas cumplicidades para prostituir, para considerar a prostituição como ideal de “liberdade”.

A prostituição VIP é livre escolha, não é o mesmo que a prostituição das mulheres pobres

Falso . As mulheres fomos ensinadas pela cultura, os meios de comunicação, a escola, nossas famílias a “ser” para…, a estar a serviço dos homens. As mulheres que são prostituídas nos lugares vip, também são usadas como mercadoria (um pouco mais cara), também tiveram aprendido que seus corpos estão ao serviço do macho, entenderam (porque o patriarcado esteve ensinando) que seus corpos podem servir-lhes para ser consumidoras de luxos, ao mesmo tempo que são consideradas objetos de consumo. Não foi uma livre escolha porque esteve condicionada pela cultura. Onde está a liberdade?

Se prostituem para dar de comer a seus filhos

Falso . Não se prostituem: SÃO prostituídas por homens que requerem seus corpos para afirmar seu poder e sua valia. As mulheres amamos a nossos filhas/os, sobretudo se escolhemos ser mães, isto não nos impossibilita de dar-nos conta que somente às mulheres se quer todos os sacrificios para seu cuidado e bem-estar. Muitas vezes suas filha/os são vendidas/os pelas redes, assim gerando lucros extras para os proxenetas.

A prostituição é um trabalho

Falso . Esta forma de legitimação é um ardil dos oportunistas que “lucram” com cada mulher em situação de prostituição, incluídas aquelas religiões, as ONGs, os sindicatos, os organismos internacionais que lhes exigem considerarem-se “trabalhadoras” para ser meritórias de assistência e – ao mesmo tempo – baixar os índices de desemprego oficiais e justificar partidas de dinheiro dedicadas a tal fim. Também é uma reivindicação de muitas mulheres que crêem divergir do papel de discriminação que a sociedade lhes reserva (pensemos como se insulta aos genocidas, assasinos corruptos, ladrões, políticos). Não sempre o consentimento legitima uma prática, e muito menos a converte em trabalho.

Todas as mulheres são putas

Falso . O sistema patriarcal utiliza a palavra “puta” para estigmatizar a qualquer mulher trasgressora (ver as letras de funk, rap, etc). Ao mesmo tempo que nos une nos separa em putas e não putas: “as obedientes”, “as domesticadas”. Novamente, o centro está sempre na culpabilização das mulheres, enquanto que ninguém diz algo que é verdadeiramente certo: todos os homens podem ser clientes.

São mulheres de vida alegre

Falso. A vida de uma mulher em situação de prostituição não é fácil nem alegre. Esta é uma expressão utilizada por clientes e proxenetas que serve para retirar destes responsabilidade no dano que produzem. O sexo prostibulário tem haver com o poder e não com o prazer. As mulheres em situação de prostituição conformam um dos grupos mais vulneráveis de todas as sociedades em todas as épocas.

Se a prostituição não existisse haveriam mais estupros

Falso. Não é verdade que os desejos sexuais dos homens sejam irrefreáveis. Isso é uma construção do patriarcado. O verdadeiro combate à prostituição e aos estupros passa por uma tomada de consciência, profunda reflexão e mudanças de condutas que promovam uma prática sexual que tenha haver com o prazer e a reciprocidade e não com o domínio.

Legalizar a prostituição (seja regulamentando-a, com registro por meio de cartão sanitário1) protege as mulheres

Falso. Não protege as mulheres em situação de prostituição que assim seriam maltratadas, mas “com permissão”, tratadas e traficadas legalmente e infectadas, já que o certificado de saúde não se exige aos clientes – ou melhor, prostituintes. Somente protege o negócio para os cafetões, proxenetas e redes de prostituição. As mulheres ficam igualmente exentas de todos os direitos e mais expostas que nunca a serem detidas. Porque decidem parar nas esquinas para fugir à “proteção” das máfias. Incrementa o negócio dos “subornos” para a polícia, já que ao estabelecer mais regras arbitrárias, a corrupção aumenta.

Proibir a prostituição é o mais digno para a sociedade

Falso . A proibição da prostituição gera mais exposição para o lado mais frágil da cadeia toda, arrebentando a corda para o lado das mulheres em situação de prostituição, porque quando se proíbe a prostituição, se persegue e se criminaliza não aos cafetões, mas as mulheres. A criminalização das mulheres individualiza o problema e não remedia o exercício da sexualidade dos homens com poder de domínio sobre as mulheres.

A mulher como provocadora e o homem como vítima não responsável

Falso . Todo homem é um cliente potencial desde que deixa de ser menino.2 O sistema patriarcal-capitalista nos ensina que os homens tem direito sobre os corpos das mulheres e, ao mesmo tempo, que os poderosos tem direito sobre os corpos de quem possui menos poder. Não é “cliente”, é prostituinte , embora seja invisibilizado. “Porque você paga que existe prostituição”.

A prostituição está inserta em um mecanismo de múltiplos sistemas de opressão e exploração: estruturas econômicas e sexistas que criam barreiras para o desenvolvimento no plano pessoal, educativo, político e no plano laboral de todas as mulheres. Eliminando muralhas sexistas e igualando possibilidades mediante a supressão de estruturas econômicas injustas é como abriremos a via para as mulheres entrampadas na exploração sexual. Eliminando a dominação masculina sobre a sexualidade das mulheres eliminaremos aos prostituintes de nossas sociedades. Respeitar os Direitos das Humanas é a consigna de nosso tempo.

***

1 É como ocorre no Uruguay, onde as vítimas são registradas, servindomais como um controle sanitário e um ‘subsídio estatal’ ao proxenetismo, apesar de passar como uma medida de proteção das mulheres.

2 E as vezes, até enquanto menino, sendo uma das formas de iniciação sexual e na masculinidade dos homens.

Traduzido e adaptado de folheto produzido pela Campanha Abolicionista “Ni una mujer más víctima de las redes de prostitución”, de Argentina.

Extraído de www.campaniaabolicionista.blogspot.com.ar

Contato:
niunavictimamas@yahoo.com.ar

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